Publicado em 27 de ago de 2019 por Mayara Armstrong

Pacarrete

20191 h 37 min
Overview

A bailarina clássica Maria Araújo Lima, mais conhecida como Pacarrete, começa a enfrentar o drama da velhice. Desde menina, ela vivia pelo seu grande sonho de se tornar uma grande bailarina, mesmo que sendo nascida e criada em Russas, uma cidade muito conservadora do interior do Ceará, onde o normal seria se casar e cuidar dos filhos. Apesar das dificuldades, ela persiste em fazer o possível para alcançar sua meta, inclusive mudar de cidade. A trajetória da artista é revisitada desde a sua origem até os dias atuais, colocando em evidência inseguranças e questões pessoais que a acompanharam durante sua carreira e vida pessoal.

Metadata
Director Allan Deberton
Runtime 1 h 37 min
Release Date 15 junho 2019
IMDb Id tt5622284
Images

por Kauana Amine, jornalista e pós-graduanda em Cinema

Pacarrete tem a sensibilidade de resgatar histórias e trazer o debate social sobre pessoas que são incompreendidas pela sociedade. Interpretada por Marcélia Cartaxo, Pacarrete sonha em fazer uma apresentação de ballet para a cidade, e durante toda a narrativa busca realizar este sonho.

Todas as cidades têm suas personalidades marcantes, que podem dividir as pessoas entre aquelas que as admiram e as que satirizam; as que buscam proximidade para entende-las, e as que nem tentam e se distanciam. Muitas vezes até são vistas como loucas e colocadas às margens. Com Pacarrete foi parecido. A personagem é inspirada em Maria Araújo, uma dessas personalidades da vida real que dividia muitas opiniões entre os habitantes. Maria viveu em Russas, no Ceará, mesma cidade do diretor Allan Deberton.

O fato de ser baseada em uma história real, causa mais comoção e proximidade por parte do telespectador. Deberton, depois de pesquisar e ouvir muitos moradores de Russas, retrata Maria por meio de Pacarrete e consegue transmitir e causar diversos sentimentos por essa figura que ali habitou.

Já no início do filme, uma cena apresenta Pacarrete: dançando enquanto varria a calçada, interagindo com as pessoas que ali passavam e consigo mesma, como se, ao mesmo tempo que fosse parte daquela cidade, estivesse vivendo em um mundo particular seu. (E quem não está?) Ela é a representação dos sonhos dentro de cada um, da persistência para não desistir, das dificuldades que se pode enfrentar no caminho e das maneiras que é possível lidar com frustrações.

Quando apresenta a casa onde a personagem vive, juntamente com sua irmã Chiquinha, interpretada por Zezita Matos, há muitos objetos e símbolos que ambientam e humanizam ainda mais a personagem e tudo que a rodeia. O elenco, que além de Marcélia e Zezita, também é composto por Soia Lira – que interpreta Maria – e João Miguel – que interpreta Miguel –, mostra singularidades dos personagens por meio de diálogos sensíveis e expressões caricatas (porém, não exageradas), e consegue transmitir a sintonia entre eles. Pacarrete, a irmã Chiquinha, Maria e Miguel convivem com as diferenças e estão sempre ali um pelo outro, representando companheirismo e generosidade, que de maneira muito simples resgatam laços tão fortes, mesmo em meio a alguns desentendimentos.

O filme também traz referências de Amélie Poulain e críticas sutis em toda a narrativa. Seja em momentos que a Pacarrete diz que não a veem, seja pelas dificuldades que enfrenta para ser ouvida pelas autoridades da cidade. Ele também traz questões sobre limitações da velhice e a maneira como as personagens lidam com essas limitações. A direção de fotografia, em conjunto com a direção de arte, maquiagem e figurino acertam nos mínimos detalhes, desde a maneira como a câmera acompanha os personagens, captando suas ações e expressões, até aos objetos em torno deles, tudo contribui para que seja uma obra de arte repleta de poesia.

A poética está presente nas excelentes atuações, nos simbolismos, no resgate à dança e ao teatro, nas escolhas das músicas inseridas na trilha sonora (como We Don’t Need Another Hero, de Tina Turner, por exemplo) e no equilíbrio entre cenas que fazem o telespectador rir e chorar ao mesmo tempo. Pacarrete é poesia em toda a sutileza e representa uma história tão singular e ao mesmo tempo tão plural, trazendo debates necessários para o cenário atual, assim como esperanças e sutilezas.

*Filme assistido no 47º Festival de Cinema de Gramado.

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